Embaixadores de Compliance – uma prática de sucesso, com origem nos anos 90
Esse modelo, se bem implementado, torna-se fator crítico para o sucesso do Compliance numa empresa. Será o divisor de águas entre um Compliance regular e um Compliance profissional.
Wagner Giovanini
Origem do Compliance
Em 2006, os escândalos relativos à corrupção, envolvendo a alemã Siemens AG, acabaram por mudar o rumo da minha carreira profissional: o Compliance caiu no meu colo, quando praticamente ninguém sabia ao certo a dimensão dessa matéria.
A minha missão era implementar, na Siemens Brasil, um mecanismo capaz de evitar a repetição da incômoda crise em curso na companhia, em nível global.
Na época, cada responsável, em seu país, recebia as diretrizes da Casa Matriz sobre “o que fazer”. No entanto, “como colocar em prática” ficava por nossa conta.
Assim, o desafio de criar um Sistema de Compliance efetivo passava por vencer hábitos e culturas locais, como por exemplo, no nosso caso, o “jeitinho brasileiro”, uma certa indisciplina no cumprimento a regras, entre outras.
Mas, o primeiro e maior obstáculo era cumprir o cronograma acordado com as autoridades americanas e alemãs: implementar tudo e gerar as evidências das práticas em funcionamento, num prazo curto demais.
Nenhum minuto poderia ser desperdiçado. Voltando para o Brasil, nas 12h dentro do avião, relacionei um conjunto enorme de atividades necessárias para cumprir a tarefa, demasiadamente desafiadora. Estimei a carga de trabalho e calculei o tamanho da equipe, indispensável para o sucesso.
Ao chegar em São Paulo, a primeira providência foi reivindicar, ao CEO da Siemens Brasil, as 8 pessoas para formar a equipe. Como a aprovação inicial foi de apenas 5, lancei mão do Plano B, contando com uma experiência testada com sucesso no passado, quando eu estava na área da Qualidade.
Experiência da área da Qualidade
Nos anos 90, fui o responsável por um projeto de abrangência nacional, com o propósito de lograr a melhoria da gestão da empresa. Assim, cada Unidade de Negócios da Siemens era avaliada segundo suas práticas, usando critérios de excelência, cuja referência era o Prêmio Nacional da Qualidade.
Após cada ciclo, as boas experiências eram compartilhadas e, uma em particular, é a de interesse nesse artigo: os facilitadores da Qualidade.
A ideia era simples, mas de valor inestimável: o departamento da Qualidade tinha uma equipe enxuta, mas contava com profissionais de outras áreas, como se fossem seus braços estendidos, para ajudarem na execução de determinadas tarefas pontuais. Em cada Unidade de Negócios, havia uma nomenclatura específica e cada uma gerenciava os facilitadores de acordo com suas próprias necessidades.
Em 2002, houve uma mudança organizacional e todas as áreas da Qualidade da empresa foram fundidas numa única diretoria, para a qual tive o prazer de ser nomeado o responsável. Dessa maneira, tal prática foi aperfeiçoada, com as ideias vindas de diversas áreas diferentes, para compor um modelo mais robusto, mais maduro.
Aproveitando a experiência e trazendo para o Compliance
Voltando para o desafio de implementar o Compliance num prazo curtíssimo, aproveitei a ideia dos facilitadores da Qualidade, para complementar a equipe aprovada pelo CEO, a fim de conseguir cumprir a carga de trabalho necessária para o projeto.
Nasceu, então, o nosso primeiro time de Embaixadores (na Siemens, denominamos de “Champions”).
Os Embaixadores foram nomeados conforme critérios da época, para uma atribuição específica. Com o passar do tempo, as exigências mudaram, os objetivos foram redefinidos e a experiência no assunto contribuíram para um melhor entendimento sobre qual o perfil era o mais adequado para essa função.
Surgiram também novas demandas e, pouco a pouco, foi se desenhando um conceito novo para se estabelecer essa filosofia. Simplesmente construir uma equipe e repassar atividades pontuais não eram mais suficientes.
O Compliance exigia mais profissionalismo e um modelo de gestão preciso, a fim de se obterem sustentabilidade e efetividade nas ações. De maneira gradativa, tudo foi sendo aperfeiçoado e o “modelo dos Champions” ganhou consistência, potencializando, desse modo, os resultados dele advindo.
Embaixadores nos dias atuais
Depois de exitosa experiência na Siemens, inclusive, relatada com alegria no meu livro “Compliance a excelência na prática”, com a primeira edição publicada em 2.014, tive a satisfação de orientar dezenas de organizações para implementar essa prática, como consultor da Compliance Total.
Dessa forma, contando com o aprendizado e desafios de cada entidade, pude aprimorar os conceitos e a metodologia, incorporando quesitos para aumentar de modo significativo a eficácia do modelo, universalizando-a para abranger instituições grandes ou pequenas.
Algumas de suas principais características merecem ser destacadas.
Insuficiente nomear pessoas de forma aleatória ou acatar indicações feitas pelos gerentes, para imaginar que, com isso, estará pronta a estrutura de Embaixadores da sua empresa.
É imprescindível atender a um perfil delineado com antecedência, em consonância com o Sistema de Compliance e a missão de cada Embaixador. A partir daí, o convencimento e sensibilização da média gerência são fatores fundamentais para a obtenção de apoio a esse sistema, visando a concordância na escolha e definição de cada Embaixador.
Um modelo de gestão deve ser implementado, antes do recrutamento desses profissionais, pois é indispensável a sua anuência e aceite dos requisitos definidos. Aqui, inúmeros fatores precisam ser abrangidos, tais como: governança; indicadores de desempenho e formas de avaliação; linha de reporte; expectativas e objetivos (que diferem de Embaixador para Embaixador, de acordo com a área, natureza de operação, riscos envolvidos, responsabilidades estabelecidas, tamanho de sua abrangência, entre outros); modelos de incentivo e remuneração; etc.
As atividades, missão, carga de trabalho e grau de envolvimento esperados para a incumbência também são aspectos básicos de serem previamente discutidos e acordados. Aliás, desconhecer tais questões de antemão impede de se fazerem as escolhas corretas no processo de seleção dos Embaixadores.
No dia a dia, o responsável pelo Compliance deve se responsabilizar em cuidar dos Embaixadores e do sucesso do modelo implementado, por exemplo:
- Estabelecer o nível esperado de conhecimento técnico e prático para os assuntos de Compliance.
Prover treinamento e capacitação frequentes aos Embaixadores. - Avaliar com regularidade o desempenho de cada um, tanto na perspectiva teórica quanto na prática.
- Dar feedbacks construtivos, corretivos ou repressivos, a fim de manter a equipe coesa, motivada e focada no alcance dos objetivos.
- Fomentar a troca de experiências entre os Embaixadores e buscar o mais alto nível de excelência nas práticas adotadas.
- Gerar confiança nos Embaixadores, por parte dos funcionários em geral.
- Promover constantemente a motivação dos Embaixadores e criar um ambiente favorável à integração de novos funcionários (“pipeline de Embaixadores” para futuras substituições).
Uma gestão efetiva dos Embaixadores não se limita à lista anterior. Pelo contrário, depende ainda de diversos aspectos de total relevância, para agregar valor consistente ao Compliance. No entanto, não cabe detalhar cada nuance dessa sistemática, mas, tão somente, alertar os interessados sobre a grandeza e complexidade conceitual inerentes.
Realidade brasileira
Infelizmente, o conceito completo para um ótimo funcionamento do modelo dos Embaixadores é pouco conhecido e, mais ainda, pouco aplicado na prática. Assim sendo, em muitas empresas, grandes inclusive, percebe-se a existência de “nomeados facilitadores”, fazendo tarefas de pouca importância e, por consequência, com baixo nível de benefício para o Compliance.
O efeito inevitável é a baixa adesão dos gerentes das áreas que, normalmente, indicam profissionais sub utilizados no dia a dia, de baixa performance nas suas atividades originais. Quer dizer, indica-se quem não faz muita falta para o setor, em vez de nomear os melhores, a fim de potencializar o Compliance no seu departamento.
Outro resultado certo é a dificuldade em atrair interessados para a função. Com o passar do tempo, novas pessoas não se motivam a dedicar parte do seu tempo para o Compliance. É um prenúncio de que alguma coisa vai mal.
E também, nada incomum, é encontrar a Alta Direção e os Conselheiros pouco animados com o modelo vigente. Muitos consideram manter esse “mal necessário”, para sustentar sistemas de Compliance falidos, porém, passíveis de serem mostrados para o mercado.
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Wagner Giovanini
Sócio fundador da Compliance Total
Especialista em Compliance