Compliance: quando falta apoio, de quem é a culpa?
Para desespero dos profissionais de Compliance, essa realidade está muito presente no ambiente corporativo. Enquanto eles estão sentados em seus escritórios, com ar-condicionado, café e bolachinhas à mesa, os responsáveis por manter a empresa viva, na crise ou fora dela, têm a missão de buscar, a todo momento, onde a organização pode ser mais produtiva, onde não há valor agregado, onde há oportunidade de redução de custo e assim por diante.
Compliance: quando falta apoio, de quem é a culpa?
Considere, por hipótese, uma empresa possuir um Programa de Compliance e se deparar com as seguintes indagações dos executivos no seu cotidiano:
- Por que eu preciso do Compliance?
- Em tempos de crise, posso focar nos problemas e retomar o Compliance depois?
- Enquanto os profissionais estão em home office, posso abrir mão da equipe de Compliance?
- Qual papel o Compliance está cumprindo?
Para desespero dos profissionais de Compliance, essa realidade está muito presente no ambiente corporativo. Enquanto eles estão sentados em seus escritórios, com ar-condicionado, café e bolachinhas à mesa, os responsáveis por manter a empresa viva, na crise ou fora dela, têm a missão de buscar, a todo momento, onde a organização pode ser mais produtiva, onde não há valor agregado, onde há oportunidade de redução de custo e assim por diante.
Por óbvio, uma crítica válida recai em quem pensa apenas em custos, esquecendo-se dos riscos. Entretanto, cabe ao Compliance Officer a missão de manter os seus parceiros convencidos sobre a íntegra do cenário envolvendo o Mecanismo de Integridade, no seu dia a dia, e não quando, porventura, o CFO formou um preconceito sobre o Compliance e já tem uma ideia pronta de fazer economias nessa matéria.
Um grande problema recorrente nas empresas e muito comum no Brasil concentra-se no próprio time de Compliance. Muitos acham ser obrigação dos dirigentes considerarem o Compliance maravilhoso e acreditarem ser a solução imprescindível. Mas, surge, então, uma pergunta: o que os profissionais dessa área estão, de fato, fazendo para esses líderes passarem a enxergar o Compliance dessa forma?
Insuficiente haver uma reunião anual, por hábito denominada de sensibilização da Alta Direção, onde seus membros passam metade do tempo checando os e-mails nos celulares, saindo para pegar café ou cutucando o colega ao lado para cochichar alguma coisa.
Na verdade, esperam-se atitudes rotineiras e ações concretas para o executivo admirar o sistema de Compliance, desejar apoiá-lo, se engajar pessoalmente. Esse resultado só é conseguido quando o alto escalão enxergar valor agregado nesse mecanismo. Caso contrário, de certo, o apoio não virá!
Alguns irão negar a minha próxima afirmação, contudo, é uma constatação prática: quando o Compliance Officer reclama da falta de apoio, na maioria das vezes, a culpa é dele próprio!
Então, por qual razão isso acontece?
A primeira questão refere-se ao perfil dos profissionais de Compliance. Muitas organizações conferem a missão de dirigir o Mecanismo de Integridade a pessoas não preparadas para a função. Mal sabem definir o seu perfil ideal e, sem o devido cuidado, delegam a responsabilidade para alguém, na maioria até bem intencionado, mas sem a capacitação própria para tal. Ignoram recomendações, como:
- Os profissionais de Compliance precisam conseguir combinar dois tipos de comportamento, embora pareçam antagônicos:
- ser rígido no cumprimento das regras e, ao mesmo tempo, amável no tratamento com as pessoas. O privilégio está no convencimento de se fazer o certo sempre, para todos os funcionários e não no conhecimento das leis.
- A empresa deve reconhecer nos funcionários de Compliance o seu porto seguro, perceber sua capacidade, honestidade, maturidade, solicitude e os motivos para serem confiáveis.
- A proatividade deve estar presente. Jamais esperar pela procura dos outros: antecipar-se às necessidades, ir até o cliente interno, fazer-se presente, arregaçar as mangas e demonstrar a sua ajuda efetiva a quem está precisando, são apenas algumas das qualidades requeridas.
- Além disso, são características imprescindíveis: ser um exímio comunicador, saber se relacionar em todas as camadas hierárquicas da organização, ter bom poder de convencimento, conseguir inspirar as pessoas.
Se a empresa erra na escolha do profissional para liderar o tema, será provável esse equívoco ser disseminado na formação da equipe. Mesmo pensando em fazer o melhor trabalho, esse líder vai escolher mal o seu time e o problema tende a aumentar.
Outro aspecto fundamental é a falta de experiência e maturidade de muitas equipes à frente do Mecanismo de Integridade. O conhecimento teórico tem o seu valor, todavia, nesse tema, é suplantado em inúmeras vezes pela prática. Saber como abordar, como tratar as questões, como endereçá-las, etc. torna-se prioritário em relação a conhecer a fundo a matéria, pois, quando essa necessidade aparece, basta consultar especialistas.
Relevante também é o estabelecimento da missão do sistema de integridade na companhia. Alguns podem imaginar ser atribuição da Alta Direção. Aliás, essa seria a intuição. Porém, o assunto “Compliance” é muito recente, nem todos têm a verdadeira dimensão do seu alcance. Portanto, o responsável pelo Mecanismo de Integridade, supostamente bom conhecedor do tema, teria a obrigação de orientar a Alta Direção. Todavia, tal fato pouco se vê na realidade. Retorna-se, então, à falta de perfil e conhecimento prático dos profissionais.
Cumpre salientar apenas dois, dos mais esquecidos aspectos práticos da missão do Mecanismo de Integridade:
- O foco do Mecanismo de Integridade deve ser nas pessoas, na sensibilização, no engajamento, na colaboração e, jamais, nos aspectos regulatórios. Para cuidar dessa matéria, já existe o departamento jurídico e basta uma boa interface bem desenhada com o Compliance, para considerar esse tópico atendido.
- A área de Compliance precisa ter a missão de contribuir com a empresa para o alcance dos objetivos empresariais. O Compliance não é um ser à parte, criado para infernizar e burocratizar a vida dos demais profissionais.
Isto posto, a missão do Mecanismo de Integridade vai ao encontro dos anseios da organização: ajudá-la na consecução de suas metas, mantendo a cultura da ética e integridade viva. Apesar de parecer insignificante à primeira vista, essa construção possui um abismo gigantesco em relação a “proteger a empresa contra riscos”. Essa segunda formulação configura-se como consequência da anterior. Para quem insiste em colocá-la como primeiro plano, resta supor pela falta de entendimento do conteúdo desse artigo.
Além disso, há outra obviedade descumprida com regularidade: em geral, as pessoas não irão passar a amar o Compliance por conta da publicação do Código de Conduta ou por comunicações frias apoiando a ética. Caberá a essa área cativar as pessoas, sensibilizá-las, convencê-las e atraí-las para reforçar essa cultura na organização.
As ações devem ser frequentes e a área de Compliance precisa estar à disposição da empresa a todo momento. A prioridade é a empresa, seus dirigentes e seus funcionários e não a própria organização de Compliance. Quando alguém necessita de ajuda, o profissional de Compliance deveria interromper os seus afazeres para prestar-lhe o devido socorro, mesmo se isso lhe custar horas-extras na sequência.
Enfim, infelizmente, as posturas esperadas de um Compliance Officer e sua equipe não são vistas nas empresas com muita frequência. Esse cenário contribui para a degradação do tema, ainda tão novo, mas, com um potencial imenso para dar a sua contribuição para um Brasil melhor.
Wagner Giovanini é especialista em Compliance e sócio-diretor da Compliance Total e Contato Seguro. Autor do livro “Compliance – a excelência na prática”, desenvolveu a Compliance Station®, plataforma inovadora para a implementação e execução do Compliance em micro e pequenas empresas. Para mais informações e conteúdos sobre o tema, acesse www.compliancetotal.com.br e https://www.linkedin.com/company/9299759/ .